quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

DECISÃO PROCEDENTE - PARCELAMENTO DOS DÉBITOS ORIUNDOS DO SIMPLES

Processo nº. 0003818-43.2010.4.05.8500 Classe 126 - MANDADO DE SEGURANÇA Impetrante: ALVES SOBRINHO ENXOVAIS LTDA. Impetrado(s): DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM ARACAJU/SE D E C I S à O Trato de Mandado de Segurança impetrado pela ALVES SOBRINHO ENXOVAIS LTDA. em face de suposto ato coator do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM ARCAJU/SE. Em sede de medida liminar, objetiva a impetrante seja determinado à autoridade apontada coatora que se abstenha de praticar qualquer ato no sentido de obstar o parcelamento dos débitos advindos do Simples Nacional, em virtude de o art. 17, V, da LC n. 123/06 ser inconstitucional e pelo fato de não existir expressa restrição na Lei n. 10.522/02 quanto ao parcelamento dos referidos débitos, concedendo, também, o depósito em juízo referente às parcelas, na forma e tempo a serem determinados mediante solicitação de parcelamento na Receita Federal do Brasil e/ou PGFN, até o julgamento final da presente demanda. Junta procuração e documentos (fls. 21/29). Determinei a intimação da parte autora para retificar o valor atribuído à causa e comprovar o recolhimento da complementação das custas processuais, sob pena de indeferimento da inicial (f. 31). O impetrante retificou o valor atribuído à causa e comprovou o recolhimento das custas complementares (fls. 38/38 e 43). Por meio da decisão de fls. 45/46, deixei para apreciar o pedido liminar após a autoridade impetrada prestar informações. A Delegada da Receita Federal do Brasil em Aracaju/SE apresentou as informações de fls. 56/76, sustentando, em suma, que não há inconstitucionalidade no dispositivo legal em comento e que o parcelamento instituído pela Lei n. 10.522/02 alcança tão somente os débitos para com a Fazenda Nacional (art. 10), enquanto o Simples Nacional envolve exações da titularidade de todos os entes políticos (art. 12 da LC n. 123/06), além de não haver previsão legal para o parcelamento de débitos do Simples Nacional. Relatados, decido. A concessão de liminar, em Mandado de Segurança, exige a presença concomitante dos dois pressupostos legais: a) a relevância do fundamento (fumus boni juris); b) o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora). Somente à vista da presença cumulativa destes requisitos é que permite a concessão da liminar requerida. Quanto ao fumus boni juris, constato, inicialmente, que a impetrante pretende seja afastada a aplicação da norma contida no art. 17, V, da LC n. 123/06, por suposta afronta a princípios encartados na Constituição, que prevêem um tratamento diferenciado e favorecido para as micro-empresas e empresas de pequeno porte. Assim estabelece o referido dispositivo legal: Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte: (...) V - que possua débito com o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa; Entretanto, não vislumbro a violação apontada. A Constituição Federal de 1988 traz as seguintes normas acerca da matéria: Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei. Tal previsão constitucional foi regulamentada inicialmente pela Lei n. 9.317/96, que instituiu o Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES. Posteriormente, essa lei foi revogada pela Lei Complementar n. 123/06, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte - SIMPLES Nacional. O Simples Nacional é um regime tributário diferenciado e simplificado, aplicável às Microempresas e às Empresas de Pequeno Porte, e foi criado em observância aos preceitos constitucionais acima citados. Especificadamente em relação ao art. 17, V, da LC n. 123/2006, tenho que a exigência da norma nele contida não vai além de reclamar do contribuinte o devido cumprimento das suas obrigações tributárias. Tal imposição é razoável, uma vez que as obrigações de natureza tributária pressupõem o respectivo adimplemento nos prazos legalmente estabelecidos, e serve como uma contraprestação ao tratamento beneficiado que o legislador constitucional pretendeu conceder às micro e às empresas de pequeno porte. Destaque-se que a norma ali descrita não veda ao contribuinte a discussão administrativa ou judicial de eventual exação que entenda não ser devida. Apenas impõe que, para tanto, deverá observar as normas tributárias relativas à suspensão da exigibilidade de tal crédito tributário, a exemplo do depósito do seu montante integral ou a concessão de medida liminar ou tutela antecipada em ações judiciais. (art. 151, II, IV e V, do CTN1). Demais disso, é de se destacar que o SIMPLES Nacional, enquanto sistema de tributação simplificado, não é obrigatório ao contribuinte. Mas, uma vez que a ele tenha aderido, usufruindo dos benefícios que o compõem, a microempresa ou empresa de pequeno porte deve observar as exigências legais também nele contidas. Sobre a constitucionalidade do art. 17, V, da LC n. 123/06, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região já se posicionou da seguinte forma: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. SIMPLES NACIONAL. EXIGÊNCIA DE REGULARIDADE FISCAL. ART. 17, V, DA LC N° 123/2006. 1. Apelante que não satisfez o requisito específico a que alude o inciso V, do art. 17, da LC n° 123/2006, qual seja, a necessidade de não estar em débito com a Fazenda Nacional ou com o INSS, para aderir ao SIMPLES, programa que tem por fim assegurar um tratamento diferenciado às Microempresas e às Empresas de Pequeno Porte, tal como previsto nos artigos 146, inciso III , alínea "d", e 170, da Constituição Federal em vigor. 2. Descabe falar em inconstitucionalidade da citada norma, pelo simples fato de nela se exigir do contribuinte o adimplemento de obrigações tributárias. 3. Exigência legal que se apresenta como uma contraprestação exigida do contribuinte, em face do tratamento ímpar que o legislador constitucional pretendeu conceder às micro e às empresas de pequeno porte. Apelação improvida2. Não vislumbro, assim, qualquer violação aos princípios constitucionais apontados, não havendo razão para se afastar a aplicabilidade dessa norma. Ultrapassada a questão acerca da constitucionalidade do art. 17, V, da LC n. 123/2006, analiso a possibilidade de inscrição dos débitos do SIMPLES no parcelamento ordinário previsto na Lei n. 10.522/02. De início, verifico que, ao contrário da Lei n. 9.317/96, que trazia norma expressa3 vedando a inclusão de débitos de impostos e contribuições do SIMPLES em parcelamento, a LC n. 123/06 não tratou expressamente do assunto, não existindo, atualmente, qualquer vedação para tanto. O Art. 17, V, da LC n. 123/2006, por seu turno, não tem força normativa para instituir tal vedação, uma vez que a previsão nele contida é, tão somente, de que não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do SIMPLES Nacional a microempresa ou empresa de pequeno porte que possua débitos com o INSS ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa. Dessa forma, considerando que o parcelamento dos débitos é uma das formas legalmente previstas para a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos exatos termos do art. 151, VI, do CTN4, nada impede que o contribuinte incluído no sistema SIMPLES Nacional mantenha, concomitantemente, um parcelamento de créditos tributários, tendo em vista que tal situação não se subsumiria à hipótese prevista no art. 17, V, supracitado. No que diz respeito à possibilidade de parcelamento de débitos tributários, o Código Tributário Nacional estatui a necessidade de previsão legislativa, estabelecendo as formas e condições em que será efetivado: Art. 155-A. O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica. Suprindo a exigência do CTN, a Lei n. 10.522/02 criou normas gerais para a concessão de parcelamento ordinário de tributos federais nos seguintes termos: Art. 10. Os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até sessenta parcelas mensais, a exclusivo critério da autoridade fazendária, na forma e condições previstas nesta Lei.(Redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002) Como se infere do dispositivo legal supracitado, o parcelamento ordinário previsto nesta lei abrange tão somente os débitos, de qualquer natureza, para com a Fazenda Nacional, não incluindo os débitos contraídos junto às Fazendas Estadual e Municipal. Por essa razão, a autoridade impetrada entende não ser possível incluir os débitos do SIMPLES Nacional no parcelamento previsto na Lei n. 10.522/02, tendo em vista que esse sistema tributário simplificado trata da apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação. Entretanto, se é certo que o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos contempla tributos de natureza federal, estadual e municipal, também o é que o referido programa discrimina as exações incidentes sobre as atividades das pequenas e microempresas e disciplina o repasse das receitas decorrentes entre os membros da federação. Para tanto, cumpre transcrever a Lei Complementar n. 123/06, instituidora do Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, na parte em que importa: Art. 12. Fica instituído o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples Nacional. Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições: I - Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ; II - Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, observado o disposto no inciso XII do § 1o deste artigo; III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL; IV - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, observado o disposto no inciso XII do § 1o deste artigo; V - Contribuição para o PIS/Pasep, observado o disposto no inciso XII do § 1o deste artigo; VI - Contribuição Patronal Previdenciária - CPP para a Seguridade Social, a cargo da pessoa jurídica, de que trata o art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, exceto no caso da microempresa e da empresa de pequeno porte que se dedique às atividades de prestação de serviços referidas no § 5o-C do art. 18 desta Lei Complementar; VII - Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS; VIII - Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS. (...). Art. 22. O Comitê Gestor definirá o sistema de repasses do total arrecadado, inclusive encargos legais, para o: I - Município ou Distrito Federal, do valor correspondente ao ISS; II - Estado ou Distrito Federal, do valor correspondente ao ICMS; III - Instituto Nacional do Seguro Social, do valor correspondente à Contribuição para manutenção da Seguridade Social. Parágrafo único. Enquanto o Comitê Gestor não regulamentar o prazo para o repasse previsto no inciso II do caput deste artigo, esse será efetuado nos prazos estabelecidos nos convênios celebrados no âmbito do colegiado a que se refere a alínea g do inciso XII do § 2o do art. 155 da Constituição Federal. Em outras palavras, sendo possível o detalhamento de cada exação e também a divisão das receitas do SIMPLES NACIONAL, nada impede o parcelamento das dívidas exclusivamente federais incluídas no regime simplificado, nos moldes da Lei n. 10.522/02. A referida Lei dispõe ainda, no seu art. 11, § 1º, que, quando se tratar de débitos inscritos em Dívida Ativa, a concessão do parcelamento fica condicionada à apresentação de garantia idônea e suficiente para o pagamento do débito, exceto quando se tratar de microempresas e empresas de pequeno porte inscrita no sistema simplificado, demonstrando, assim, a possibilidade de tais empresas manterem parcelamento nos termos em que instituiu: Art. 11. O parcelamento terá sua formalização condicionada ao prévio pagamento da primeira prestação, conforme o montante do débito e o prazo solicitado, observado o disposto no § 1o do art. 13 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009) § 1o Observados os limites e as condições estabelecidos em portaria do Ministro de Estado da Fazenda, em se tratando de débitos inscritos em Dívida Ativa, a concessão do parcelamento fica condicionada à apresentação, pelo devedor, de garantia real ou fidejussória, inclusive fiança bancária, idônea e suficiente para o pagamento do débito, exceto quando se tratar de microempresas e empresas de pequeno porte optantes pela inscrição no Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte - Simples, de que trata a Lei no 9.317, de 5 de dezembro de 1996. Assim, vislumbro a presença apenas em parte do fumus boni juris nas alegações da impetrante, no que se reporta ao parcelamento dos débitos federais incluídos no SIMPLES. Quanto aos débitos tributários relativos às Fazendas Estadual e Municipal, por não estarem abrangidos no âmbito do parcelamento da Lei n. 10.522/02, não há como acolher as alegações do impetrante. Em relação ao periculum in mora, verifico que a não inclusão dos débitos da impetrante em parcelamento, com a conseqüente suspensão de sua exigibilidade poderá acarretar danos de difícil reparação, dentre eles a sua exclusão do sistema tributário simplificado. Diante dos fundamentos acima elencados, DEFIRO PARCIALMENTE a liminar e determino que o impetrado analise o pedido de parcelamento da empresa impetrante tão-somente quanto aos débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e os débitos para com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, nos termos do art. 1º da Lei n. 10.522/02. Fixo multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) para o caso de descumprimento, sem prejuízo de outras cominações legais. Notificar a autoridade apontada como coatora para prestar, querendo, as informações, no prazo legal. Dar ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito, em conformidade com o art. 7º, II, da Lei n. 12.016/09. Após, vista ao MPF para emissão de parecer, querendo, nos termos do art. 12, do diploma acima mencionado. Intimar. Aracaju, 25 de outubro de 2010. Telma Maria Santos Juiza Federal 1 Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: (...) II - o depósito do seu montante integral; (...) IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança; V - a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial. 2 TRF 5ª Região - AMS 101720 - 3ª Turma - Rel. Dês. Fed. Geraldo Apoliano, j. 13/11/2008, pub. DJ 26/02/2009, p. 242, nº 38. 3 Art. 6º. § 2°. Os impostos e contribuições devidos pelas pessoas jurídicas inscritas no SIMPLES não poderão ser objeto de parcelamento. 4 Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: (...) VI - o parcelamento. ?? ?? ?? ?? Processo nº. 0003818-43.2010.4.05.8500 IX PODER JUDICIÁRIO Justiça Federal de Primeira Instância SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SERGIPE 1ª VARA FEDERAL
“Pois nada há de oculto que não se torne manifesto, e nada é segredo que não seja conhecido e venha a luz do dia.” (Lucas 8,17)
...medite, viva o mais próximo que puder da retidão.